sábado, 13 de novembro de 2010

sobre o Caio, as aventuras e o vazio.

"Às vezes um silêncio se instalava e nada era capaz de expulsa-lo do ar. Podíamos tentar. Uma conversa sobre qualquer coisa: os amigos em comum, os compromissos, as ambições. Mas sabíamos que aquilo que tínhamos em comum era muito pouco para nos unir ou criar em nós vínculos maiores. Éramos o que se via ali: duas pessoas completamente diferentes e de idades significativamente contrastantes, mas que em determinados momentos, fingiam estar em sintonia.
Caio era quase treze anos mais velho que eu, era formado e tinha seu próprio escritório; ganhava bem – muito bem para os meus padrões, pouco para os dele. Eu me sentia adulta quando ele vinha me buscar de carro e íamos para algum lugar, ouvindo música eletrônica alta e tentando driblar a falta de afinidades. Até hoje não sei ao certo o que ele pensava sobre mim. Nas minhas concepções, me achava uma pessoa neutra, naquelas onde nada se ressalta ou odeia. Talvez meio burra. Meio criança? Não sei. Eu realmente passava grande parte do tempo quieta ou roendo os cantos das minhas unhas enquanto ele estava ao volante.
No entanto, o destino nunca ficava a mais de vinte minutos de casa. E era sempre um lugar agradável, apesar de um pouco acima dos meus padrões financeiros; mais uma vez. E era visível que a rotatividade de mulheres naqueles ambientes era grande. Pelo caráter do Caio, pela sua independência, pelos seus gostos. Se eu me importava? Nunca entendi a posição dos meus sentimentos nisso tudo. Só não gostava quando conversava ao telefone com outra garota na minha frente, porque deixava claro que tratava todas exatamente iguais. De qualquer forma, quando sua boca escorregava pela minha barriga, eu simplesmente esquecia porque estava ali. Aquela vida louca que ele levava me garantia, ainda que por segundos em meses, um prazer quase adimensional.
Não, o Caio não fazia como o Dan. Era mil vezes melhor. Ensinou-me um monte de coisas, tantas que o Dan ficaria surpreso se pudesse prova-las – porque os melhores elogios, e talvez os motivos que faziam o Caio me ligar de vez em quando, eram exatamente aqueles aspectos que Dan considerava desprezíveis e/ou desagradáveis em mim. Mas seria estupidez não confessar que eu aceitava essa condição de quase-objeto, na tentativa frustrante de encontrar alguém com quem pudesse estabelecer um relacionamento semelhante àquele que tínhamos eu e Dan.
O Caio não se dava ao trabalho de me conhecer, de querer saber o que eu pensava ou sentia. Quando lhe disse sobre a medicina, respondeu que eu precisaria de muito dinheiro pra pagar a faculdade. E quando eu lhe perguntava se nunca iria cansar daquela rotina louca de se drogar em festas de música eletrônica e comer todas as garotas da cidade, ele sentia mais orgulho ainda de ser como era. ‘Essa é a minha vida, vida louca, vida de curtição. Trabalho para gastar com o meu próprio bem estar, com o meu prazer. Trabalho para pagar quantas bebidas ela quiser durante a noite’ dizia. E na minha cabeça eu completava ‘... Desde que ela possa ser mais uma na minha lista no dia seguinte.’ E era por isso que quanto mais eu saia com o Caio, mais eu queria que ao erguer a cabeça, fosse o Dan ali. Porque o Dan me conhecia um pouco mais. Ele sabia que eu não era burra, sabia que eu iria realizar meus sonhos. O Dan me perguntava como eu estava e nós conversávamos. E nós dormíamos juntos. Isso me fazia sentir querida, ainda que só por algumas horas. Porque eu sabia que aquele momento era meu, e não um encaixe numa agenda cheia de coisas mais importantes.
Inegável: o Caio fazia de um jeito quase sobrenatural.
Irrefutável: ele não significava absolutamente nada pra mim, e só servia pra cutucar minhas feridas.
O que eu sentia mesmo, eram saudades do Dan."

por MARA - aquela que mora aqui dentro de mim.

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